orlando

Orlando Mollica
A Imagem, o Pintor e o Modelo
A Imagem
Que bam que artistas como Mollica nos relembrem que a criação de imagens está na base de toda essa confusão em que se tornou a produção plástica contemporânea!
Que ótimo que nos relembre também que estas imagens não precisam ser nem esquisitas, nem feiosas, nem mórbidas, nem grosseiramente bad!
Uma imagem pode ser simples e delicadamente alguma coisa que remeta a alguma outra coisa que o artista tomou com modelo.
Os Modelos Tradicionais, a Libetação
Tem quase um século a árdua luta pela libertação dos modelos tradicionais de criação pictórica, modelos estes, para alguns, talvez demasiadamente:
pretensiosos, religiosos ou épicos, mentirosos, perspectivos, aprisionantes, vivos, irrequietos, irritantes, visuais, superficiais, retinianos, técnicos, oleosos, afrescos e fedorentos, reais, provincianos, banais, nus gordos e suados, objetuais, mortos e pesados, materiais, sujos e vulgares
Alguns até bonitos, por vezes mesmo lindos, um horror!
Os Novos modelos parasitários internacionais
E da conquista de um espaço livre de qualquer condicionante ao processo criativo que surge inexplicavelmente um "'o tipo de modelo, uma nova ameaça para a criação. Responsáveis pelo achatamento do mundo, destroem as particularidades de cada indivíduo, de cada cultura. Atacam Indiscriminadamente artistas, críticos, curadores, galeristas e diretores de museu.
São inacreditavelmente sedutores e hipnotizantes, metamórficos por natureza, assumem indiscriminadamente qualquer forma de estar in. Levam ao ridículo até mesmo profissionais competentes que, de pop se tornam minimal, de conceituais se tornam expressionistas, de expressionistas, conceituais de novo.
Por vezes se pretendem experimentais. Repudiam a cor, se confundem com lixo e se esparramam pelo chão. Por vezes. conservadores, se agarram aos pincéis e pintam desesperadamente.
Com a mesma rapidez que levam suas vítimas ao estrelato, tornando-as in, as tornam out, fora de moda, ultrapassadas, solitárias e velhas.
Para evitar a contaminação fazemos de tudo: cortamos todos os canais de acesso ao mundo. fechamos as portas e as janelas, desligamos os rádios e as televisões. cancelamos a assinatura da Artforum e Art Press. Fazemos quadrados, bordados e cruzes.
Alguns de nós desenvolvem estratégias sofisticadíssimas.
Mollica nos propõe olhar de perto o que nos rodeia, como se nossos olhos fossem poderosas lentes, detalhadamente, obsessivamente, com o domínio de um grande mestre, mancha por mancha da pele de uma goiaba que encontramos no quintal, escama por escama de um peixe, detalhe por detalhe de um livro antigo, de imagens dos primeiros pintores que por aqui andaram.
Mollica sobreviveu ao contágio.
E um herói.
Rio, outubro de 1998.
João Grijó
Sobre a exposição Aquarelas do Brasil